Sob relatoria do desembargador Orlando Perri, a Primeira Câmara Criminal, por unanimidade, negou recurso em que o Ministério Público (MPE) pedia que a médica Letícia Bortolini fosse submetida ao Tribunal do Júri pelo atropelamento que tirou a vida do verdureiro Francisco Lucio Maia em 2018, em Cuiabá. Os magistrados do Tribunal de Justiça proferiram a decisão colegiada em sessão de julgamento ocorrida nesta terça-feira (26).
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Juiz desclassifica conduta dolosa e médica que atropelou verdureiro não será julgada pelo Tribunal do Júri
Denunciada pelo Ministério Público (MPE) por homicídio doloso, ela é acusada de atropelar e matar o verdureiro Francisco Lúcio Maia. Em novembro de 2022, o juiz Wladymir Perri desclassificou o crime de homicídio doloso imputado.
Ele ficou encarregado do caso após o juiz Flávio Miraglia deixar a vara criminal para assumir a 1ª Vara Especializada da Fazenda Pública de Cuiabá. No entendimento de Wladymir, a pronuncia da médica para que ela respondesse no tribunal do Júri era equivocada.
No entanto, em fevereiro deste ano, o promotor de Justiça Vinicius Gahyva Martins alegou inclinação pessoal de Perri e apresentou recurso aos magistrados da Primeira Câmara Criminal pedindo que ela fosse julgada perante júri popular por homicídio doloso, quando há intenção de matar.
Para Wladymir, atropelamentos via de regra culposos (crime praticado sem intenção), impõe-se a indicação de elementos concretos que evidenciem a assunção do risco de produzir o resultado, o dolo eventual.
Contra tal ordem, o promotor Vinícius Gahyva afirmou que há evidências que comprovem o dolo de Letícia ao atropelar o verdureiro. "Ainda, de antemão é importante esclarecer que o que guiou a decisão desclassificatória do d. magistrado não foi a disciplina estatuída pelo Código de Processo Penal, mas um convencimento pessoal, extrajurídico".
O promotor afirmou que Perri se embasou somente na palavra de Letícia e das testemunhas arroladas por ela para afirmar que a médica não estava sob efeito de bebidas alcoólicas.
Perri também havia rechaçado laudo elaborado pela Perícia Oficial de Identificação Técnica (Politec), afirmando que o mesmo estaria incompleto. Para ele, ainda que se considerasse que Letícia realmente trafegava a 101km/h, tal velocidade não caracterizaria “excesso extraordinário, a indicar ter ela assumido o risco do resultado danoso”.
Na concepção do promotor, tal posicionamento mostra que o juiz optou por desconsiderar o excesso de velocidade, quase o dobro regulamentado para a via, como um dos fatores que reforçaram o dolo eventual e, por conseguinte, a causação do resultado.
Diante disso, o Ministério Público, por intermédio de Gahyva, pediu ao Tribunal de Justiça que fosse restabelecida a primeira decisão que pronunciou Letícia, proferida pelo juiz Flávio Miraglia.
Relator do processo no Tribunal de Justiça, o desembargador Orlando Perri afirmou que as provas sobre a embriaguez de Letícia não são contundentes.
Ele entendeu, também, que embora estivesse em velocidade acima do permitido na avenida, foi o verdureiro quem contribuiu para o acidente ao entrar repentinamente na via.
Além disso, citou que a vítima estava alcoolizada e empurrava um carrinho de cor escura, o que prejudicou a visão da médica.
“A ré foi surpreendida com a entrada da vítima na pista de rolamento, o que a impediu de fazer qualquer ação para evitar o atropelamento. Data vênia, a vítima acabou por contribuir para a desgraça própria”, afirmou o desembargador.
O fato de a médica ter saído do local sem prestar socorro também foi isentado pelo desembargador, que se convenceu de que ela o fez por não ter percebido o atropelamento.