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Sábado, 27 de abril de 2024

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PRESO POR TRÁFICO EM SP

Após foragido da PF reivindicar terra, advogado garante fazenda avaliada em R$ 200 milhões a produtores de Sinop

Foto: Olhar Direto

Após foragido da PF reivindicar terra, advogado garante fazenda avaliada em R$ 200 milhões a produtores de Sinop
Não fosse o advogado Antonio João de Carvalho Jr realizar uma devassa documental em toda cadeia sucessória de uma fazenda em Sinop e descobrir a falsidade ideológica de EdIson Martins Gomes, e a desembargadora Marilsen Andrade Addário decidir analisar todos os detalhes do caso antes de proferir seu voto em julgamento, talvez nem os Lerner nem os Ottoni estariam hoje aguardando a reintegração da posse de 2.420 hectares ocupados pacificamente por eles há 40 anos, avaliados em R$ 200 milhões.

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​Antonio João de Carvalho Jr concedeu entrevista exclusiva ao Olhar Jurídico e explicou os eventos que cercaram a disputa pelas terras, destacando os desafios enfrentados pelas famílias ao longo dos anos, e sua determinação em buscar justiça através do sistema legal.

O caso revelou uma conspiração de grandes proporções, com o falsário que foi mudando de identidade há décadas, enganando o sistema judicial e sendo glorificado como herói em Alta Floresta, a mais de mil quilômetros de São Paulo, estado onde ele foragiu da Polícia Federal após ser preso por tráfico de drogas.

O advogado foi contratado quando o caso já estava sendo decidido em favor do falsário e após realizar uma devassa documental nos autos, detalhou os eventos que levaram à recente decisão judicial, que reconheceu a usucapião em favor das famílias vítimas, trazendo à tona uma série de questões controversas e a questão de ordem pública referente à falsidade ideológica de Edison, conhecido em Mato Grosso como “mão branca”.

No último dia 20, o Tribunal de Justiça reconheceu a posse sobre a área rural situada no “Lote Claro”. Por maioria, os magistrados da Primeira Câmara de Direito Privado mantiveram a sentença de primeiro grau que negou ação reivindicatória ajuizada por Edison Martins Gomes contra os produtores José Altemir Ottoni, Beatriz Lauxen Ottoni, Reneu Jacob Lerner e Bernardete Lerner.

Foragido da PF por tráfico

O advogado revelou que o suposto proprietário, Edison Martins Gomes, não passava de um falsário, cujo nome verdadeiro é Edson Ramos Camargo, usado por um advogado chamado Pedro Pereira de Sousa, vulgo Pedro Nó, para ajuizar a ação reivindicatória, em 2010.

Usando a identidade de Edison, Pedro Nó teria arquitetado uma fraude documental para se apropriar indevidamente não apenas dos 2.420 hectares, mas de toda a área, de 6.000 mil hectares, ocupada pacificamente pelas famílias desde 1982.

A fraude se tornou aparente quando a equipe jurídica de Antonio João realizou uma investigação minuciosa sobre a identidade de Edison Martins Gomes. Descobriu-se que Gomes utilizava várias identidades falsas, com divergências significativas, incluindo diferenças nas fotografias das identidades e múltiplos números de CPF.
 
A investigação revelou ainda que Edison tem histórico criminal, incluindo uma condenação por tráfico de drogas no estado de São Paulo. Após fugir da prisão, realizada pela Polícia Federal, Gomes estabeleceu-se em Mato Grosso, em Alta Floresta, onde intensificou o uso de documentos falsificados, inclusive em transações imobiliárias.

No interior de Mato Grosso, ele ficou conhecido como “mão branca”. “Quando ele evadiu-se da Polícia Federal com mais dois portugueses, os dois foram recapturados, ele não. E ele trocou de nome imediatamente, foi para a Alta Floresta e virou um herói por lá, onde ele é conhecido como 'Martins Mão Branca'. Isso por ser portador de vitiligo na mão. E lá ele era piloto de avião, fazia contrabando, agiotagem, cobrança, e toda sorte de ilicitudes. E ele virou um herói lá. Ele teve uma vida, meio século de vida com esse outro nome, o que não transforma o falso em verdadeiro. O falso sempre vai ser falso”, explicou o advogado.

Atualmente com mais de 80 anos, Edison vive impune e gozando do patrimônio obtido ilicitamente, instalado em Balneário Camboriú, Santa Catarina, onde é dono de imobiliárias e imóveis diversos. “Está vivo. Nós o localizamos em Balneário Camboriú e sabemos onde reside”, completou o advogado.

Desconfiança da relatora

Desde 2016, até a data desta matéria, as famílias Lerner e Ottoni estão privadas do acesso e uso da área. O julgamento, que já corria no Tribunal e estava dando vitória a Edison, foi adiado devido à falta de quórum e o Superior Tribunal de Justiça determinou que nova sessão fosse realizada.

Diante disso, a desembargadora Marilsen Addario, relatora do caso, pediu vista para analisar o processo antes de apresentar seu voto. Ela não se sentiu confortável em decidir sem antes examinar todos os detalhes do litígio. Foi nesse ponto que o advogado Antônio entrou em cena, identificando uma falha crucial no título de propriedade e na identidade do indivíduo envolvido.

Antônio ressaltou a conexão entre falsificações documentais e disputas por terras, especialmente no contexto da ação reivindicatória em questão, e isso chamou atenção dos magistrados.

Este tipo de ação, segundo ele, é propenso a fraudes, com indivíduos se valendo de documentos falsos para reivindicar a posse de terras, sob o pretexto de posse injusta por parte dos legítimos possuidores. Esta prática, embora ilegal, é lamentavelmente comum no estado de Mato Grosso.

A reanálise de Addário após a contratação de Antônio João, foi determinante para se alterar o desfecho até então desenhado em favor do falsário Edison Martins Gomes.

Isso porque, até 2016, o Tribunal, induzido em erro pelas artimanhas de “mão-branca”, estava dando razão a este e quase lhe concedeu a posse definitiva sobre a fazenda. Inclusive, havia a possibilidade de os Lerner e os Ottoni terem, ainda, que indenizá-lo em R$ 60 milhões. O olhar atento de Marilsen e a expertise de Antônio João evitaram que isso ocorresse.

Posse mansa e pacífica

Desde 1982, os membros da família cultivaram a terra sem qualquer disputa legal, até que foram forçados a sair por ordem judicial, em 2016. O advogado ressaltou que a família cumpriu a ordem sem criar conflitos, evidenciando sua disposição para resolver a questão de forma pacífica.

Atualmente, a terra disputada é totalmente dedicada à atividade agropecuária, sob o nome de Fazenda Bonanza. Os legítimos proprietários, Lerner e Ottoni, aguardam decisão sobre pedido de reintegração de posse e consequente desocupação.

Além disso, a denúncia aponta para a vulnerabilidade dos registros públicos, explorados para construir um direito de propriedade fictício, enquanto indivíduos legítimos sofriam injustamente. Surpreendentemente, o acusado, agora milionário graças ao fruto dos crimes referidos, chegou a apresentar uma declaração de pobreza assinada, na verdade, pelo próprio Pedro Nó, ilustrando uma atitude criminosa destemida e ousada.

Antônio João destacou que ação reivindicatória é aquela em que o proprietário não possuidor busca obter para si a posse exercida pelo possuidor não proprietário, não bastando ao advogado possuir grande sabedoria jurídica, mas principalmente habilidade na produção de provas que possam sustentar suas alegações. Afinal, o que não está nos autos, não está no mundo.

Alerta aos agricultores

O litígio acendeu um alerta aos produtores rurais de Mato Grosso. Segundo Antônio João, especialista em questões possessórias voltadas também pro agronegócio e, sobretudo em investigação documental, o exame nos documentos contidos nesse tipo de processo é fundamental para evitar que essas fraudes aconteçam.

Segundo o jurista, quando o falsário ingressa com uma ação dessa natureza, esses documentos, essas fraudes já foram cometidas anos atrás. Então, a pessoa que é demandada, se não tem um profissional que lhe auxilie e que esteja preocupado em fazer uma investigação cadastral e de toda a cadeia sucessória, sofrerá o golpe inevitavelmente.

“Então, é importante hoje a investigação da cadeia sucessória porque a fraude vai estar em uma dessas transferências, não importando o tempo em que fora praticada, sendo questão imprescritível e insuscetível de confirmação”, disse.

Segundo Antônio João, a cadeia sucessória de títulos definitivos expedidos entre os anos 50, 60 e 70, por exemplo, foram muitas vezes fraudadas por meio de transferências efetivadas por meio de procurações falsas, sendo esta uma das formas de se praticar a fraude dominial.

“Existem grandes propriedades rurais no estado de Mato Grosso que, eu posso afirmar, seus proprietários não têm conhecimento de qualquer fraude na cadeia sucessória. Estão, sem saber, em uma propriedade lastreada por fraudes. Veja você que filhos e netos de legítimos proprietários rurais podem sequer terem conhecimento da referida propriedade, pelo cometimento de fraude na transferência do domínio, através de procuração e documentos falsos. Só é possível descobrir fraudes dessa natureza com uma meticulosa investigação documental, o que demanda complexo trabalho técnico e experiência. E sem essa investigação a chance de perda do patrimônio familiar é de 100%.”, concluiu, destacando a importância de uma assessoria jurídica preparada para este tipo de controvérsia.
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