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Sexta-feira, 10 de maio de 2024

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RETROSPECTIVA 2015

Silval Barbosa, um príncipe sem virtú: retrospectiva de um ex-governador que acabou na cadeia

Foto: Rogério Florentino Pereira/Olhar Direto

Silval Barbosa, um príncipe sem virtú: retrospectiva de um ex-governador que acabou na cadeia
O Olhar Direto/ Jurídico publica neste final de 2015 uma série de reportagens especiais sobre o ano dos principais personagens presentes nas manchetes em Mato Grosso. O primeiro a figurar na retrospectiva do Olhar Jurídico é o ex-governador Silval da Cunha Barbosa. Reunindo trechos da obra “O Príncipe”, escrita por Nicolau Maquiavel, uma rápida retrospectiva, de forma intercalada, foi traçada sobre o ano de Silval, que em primeiro de janeiro passou a faixa de chefe do executivo para Pedro Taques e chegou ao mês de dezembro preso, junto com três ex-secretários. Confira:


*“Digo, pois, que para a preservação dos Estados hereditários e afeiçoados à linhagem de seu príncipe, as dificuldades são assaz menores que nos novos, pois é bastante não preterir os costumes dos antepassados e, depois, contemporizar com os acontecimentos fortuitos, de forma que, se tal príncipe for dotado de ordinária capacidade sempre se manterá no poder”.


O Início

Liderado pelo empresário Blairo Maggi, o Poder Executivo de Mato Grosso, de 2003 a 2010, correspondeu ao que um Estado economicamente conduzido por produtores rurais deseja. Maggi, “rei da soja”, deixou o posto com altos índices de aprovação e não enfrentou grandes dificuldades para se eleger senador na mesma eleição em que fez seu sucessor. O escolhido para assumir seu posto seria, obviamente, um homem vigoroso, de imagem segura e personalidade reta. Acabou eleito Silval da Cunha Barbosa (PMDB), até então vice-governador, que deveria corresponder ao seu mentor, e no dia 31 de março de 2010 tomou posse, antes do fim do segundo mandato de Maggi. Sete meses depois venceria a eleição ainda no primeiro turno, conduzido pela “palma da mão” do seu aliado.

Respeitadas as singularidades de um regime político monárquico, nas palavras de Nicolau Maquiavel, no tratado intitulado “O Príncipe”, destinado ao Duque de Urbino, Lourenço II de Médici, um bom governante deve, mesmo que derivado de uma linhagem ligada ao Estado, possuir virtú: capacidade de controlar acontecimentos e ocasiões, criar estratégias e pensar de forma factual a constante imprevisibilidade do tempo.

O contexto descrito por Maquiavel, um dos primeiros com capacidade de romper, para administrar, com os laços cristãos e morais, no século XVI, pode ser transposto, com óbvio desrespeito à historicidade, aos últimos anos do Poder Executivo em Mato Grosso. Silval Barbosa atravessou, entre 2010 e 2014, momentos péssimos que emergiam, em raras ocasiões, para estágios de regular “sucesso”. Em meio a acusações de corrupção e a flagrante falta de capacidade de gerenciamento, o final seria catastrófico – mesmo com a Copa do Pantanal, o representante do PMDB acabou dissolvido por um melancólico mal-estar. Terminou o mandato sem poder dar as caras na campanha para não “atrapalhar” ninguém. Sem chance de fazer seu sucessor.

“Eu não quis ficar respondendo acusações feitas durante a campanha, para não ‘contaminar’ com o período eleitoral. Mas eu desafio meus sucessores a fazerem pelo menos 50% do que eu fiz. Está lançado o desafio”, disse Silval, após participar do primeiro teste do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT), um de seus últimos atos como chefe do Executivo.



*“Tens como inimigos todos aqueles que ofendeste com a ocupação daquele principado e não podes manter como amigos os que te puseram ali, por não poderes satisfazê-los pela forma por que tinham imaginado, nem aplicar-lhes corretivos violentos uma vez que estás a eles obrigado”.


Derrocada

Em 2015, com a posse de Pedro Taques (PSDB), acaba o foro por prerrogativa de função empregado a Silval Barbosa. Investigado em várias frentes pelo Ministério Público de Mato Grosso, o agora ex-governador passa a ser figura acuada, esmagada pela opinião pública como a pior gestão da história. Sem Virtú, o político tropeça em seu presente.

Assim, após meses de pressão, no dia 15 de setembro de 2015, durante a Operação Sodoma, desencadeada pelo Policia Civil, a magistrada Selma Rosane de Arruda, da Sétima Vara Criminal de Cuiabá, determinou a prisão preventiva de Silval, por um suposto esquema de crimes de corrupção e lavagem de dinheiro.

Na ocasião da Operação, Pedro Nadaf e Marcel de Cursi, ex-secretários de Estado, foram detidos. A Sodoma, que investiga um suposto esquema de fraudes em incentivos fiscais, teve como base a delação desempenhada pelo empresário João Batista Rosa, que, segundo o MPE, sofreu extorsão para participar do Programa de Desenvolvimento Industrial e Comercial de Mato Grosso – PRODEIC.

Conforme denúncia, o grupo político liderado pelo ex-governador de Mato Grosso envolveu Rosa, em 2011, ainda no primeiro ano do mandato após a reeleição, em uma teia de ameaças e intimidações que durou até julho de 2015, após mais de seis meses do termino da gestão.

Para o MP, Barbosa "compôs seu staff com agentes afinados aos seus propósitos criminosos, lotando-os em cargos estratégicos, nas Secretarias com atribuição na área tributária (cobrança/arrecadação/benefícios fiscais), objetivando capitalizar no interesse da organização recursos que exigiam/recebiam da classe empresarial mato-grossense".

Mesmo com sua prisão preventiva decretada pela Justiça desde o dia 15 de setembro, Barbosa se apresentou em juízo apenas no dia 17 daquele mês.


 


*“Estes nossos príncipes que tinham permanecido muitos anos em seus principados para depois perdê-los, não podem acusar a sorte, mas sim a sua própria ignávia, pois, não tendo nunca, nos tempos pacíficos, pensado que estes poderiam mudar (o que é defeito comum dos homens na bonança não se preocupar com a tempestade) quando chegaram os tempos adversos preocuparam-se em fugir e não em defender-se, esperando que as populações, cansadas da insolência dos vencedores, os chamassem de volta”.

Derrotas

"Não me sinto humilhado". Foram as únicas palavras do ex-governador de Mato Grosso ao chegar para prestar depoimento e cumprir prisão. Desde a efetiva detenção, o representante do PMDB sofreu seguidas derrotas em recursos por sua liberdade.

Ainda no dia 18 de setembro, o desembargador Alberto Ferreira de Souza, da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, indeferiu Habeas Corpus rogado pelo ex-governador. Na decisão, o magistrado refutou a tese da defesa de que Silval, preso, estaria sofrendo constrangimento ilegal.

Em instância superior, no Superior Tribunal de Justiça, o Ministro Ericson Maranho, da Sexta Turma, negou procedimento jurídico que buscava retirar Barbosa do Centro de Custódia da Capital, no dia 24 de setembro. Ainda no mês nove, no dia 30, o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, também indeferiu pedido liminar pela liberdade.

O STJ foi acionado novamente pela defesa do réu, que observou negativa pelo pedido liminar no dia 27 de novembro. No STF, no dia 18 de dezembro, outro Habeas Corpus foi negado. No dia 24 de dezembro, a desembargadora Serly Marcondes Alves tambpem indeferiu recurso. O STJ negou novamente na noite desta segunda-feira (28) o último pedido de HC impetrado pelo ex-governador. Atualmente, com o recesso forense do Poder Judiciário, que perdurará até o dia 6 de janeiro, novos procedimentos serão julgados apenas no próximo ano.

*“Portanto, um príncipe deve gastar pouco para não precisar roubar seus súditos, para poder defender-se, para não ficar pobre e desprezado, para não ser forçado a tornar-se rapace, não se importando de incorrer na fama de miserável, porque esse é um daqueles defeitos que o fazem reinar”.
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