O princípio constitucional de que o regime de previdência tem caráter contributivo e solidário deve ser observado nas discussões sobre desaposentação. Este é o posicionamento da Advocacia-Geral da União (AGU) em defesa do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) para afastar, no Supremo Tribunal Federal (STF), a utilização de tempo de serviço posterior à aposentadoria para revisão dos valores do benefício. A sessão desta quinta-feira (09/10) deu continuidade ao julgamento da questão, mas o debate foi suspenso em razão do quórum.
A desaposentação é caracterizada pela possibilidade do aposentado solicitar o recálculo de sua aposentadoria para computar as contribuições recolhidas após a concessão deste benefício, sem a devolução dos valores à Previdência Social.
A Advocacia-Geral e o INSS atuam conjuntamente no exame da constitucionalidade de requerimento feito por segurado beneficiado com a aposentadoria especial, contados 27 anos de tempo de serviço, e que continuou a trabalhar. Posteriormente, o autor foi à Justiça com o objetivo de legitimar a renúncia à aposentadoria e obter a revisão do valor recebido, desta vez por tempo de contribuição.
O Advogado-Geral da União, ministro Luís Inácio Adams, destacou, na tribuna do Plenário, a finalidade dos dispositivos legais e dos princípios da Constituição Federal que regem o Regime Geral da Previdência Social. Conforme ressaltou, o modelo do sistema previdenciário brasileiro se ampara no princípio da sociedade solidária previsto no artigo 3, inciso I, da Constituição. Adams afirmou que o texto constitucional justifica a contribuição dos aposentados para o regime previdenciário. "Eles são corresponsáveis pela sustentabilidade do sistema", considerou.
O ministro Adams informou que, em 2014, a arrecadação líquida total do regime geral de contribuição previdenciária atingiu cerca de R$ 337 bilhões, dos quais R$ 321 bilhões vêm da contribuição urbana e R$ 6 bilhões, da contribuição rural. Ele explicou que a contribuição urbana equaciona o déficit da contribuição rural e ainda é necessária a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social, paga pelos empregadores, para dar a cobertura integral que o sistema tem que ter. "Portanto, a contribuição não é propriedade pessoal, é uma contribuição obrigatória, imposta a toda sociedade, para sustentar o sistema. E nessa solidariedade inerente é que nós estamos atingindo o objetivo central da República", concluiu.
A sustentação oral por parte do INSS foi feita pelo Procurador-Geral Federal, Marcelo Siqueira, que também foi à tribuna do STF para defender a lógica do regime previdenciário. Destacou que a principal preocupação da autarquia em relação ao tema é a ausência de fonte de custeio. "O sistema previdenciário no Brasil não é de capitalização, mas de repartição simples com forte conotação na solidariedade. Isso quer dizer que cada um dos segurados contribui não somente para o seu próprio benefício no futuro, mas a massa de segurados da atual geração contribui para suportar os benefícios concedidos para a geração que não está mais em atividade", ponderou.
O Procurador-Geral Federal alertou que nos mais de 123 mil processos judiciais em que se discute a desaposentação a tese de renúncia não deve proceder. "Na verdade, é uma renúncia simulada com objetivo específico de majorar o benefício anteriormente concedido", avaliou. Segundo ele, o impacto financeiro de uma decisão favorável ao procedimento pode chegar a R$ 70 bilhões nos próximos 20 anos.
Siqueira também rebateu as alegações dos segurados de que com as aposentadorias já cumpriram a meta contributiva e que teriam o direito ao retorno imediato do valor recolhido pelo INSS se continuarem trabalhando. Contra o argumento, o Procurador-Geral colocou a hipótese de um segurado que tenha trabalhado por um ano e um dia, mas que se tornou inválido, e passou a receber uma aposentadoria por invalidez. "Ele obviamente não cumpriu com sua meta contributiva para receber a aposentadoria por invalidez, mas vai recebê-la exatamente porque temos um sistema previdenciário de repartição simples, solidário, e não de capitalização", definiu.
De acordo com o Procurador-Geral Federal, a legislação que instituiu o fator previdenciário visou o equilíbrio financeiro e atuarial do sistema de previdência, entendimento confirmado pelo STF no julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade nº 2110 e nº 2111, tendo em vista que o regime geral não é condicionado à idade do segurado.
O ministro relator, Roberto Barroso, deu provimento parcial à ação do INSS, mas previu a possibilidade da desaposentação em seu voto. O julgamento foi suspenso em razão da ausência dos ministros Dias Toffoli, Cármen Lúcia e Teori Zavascki.
Ref.: Recurso Extraordinário (RE) 661256, em conjunto com o RE 827833 - STF.