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Sábado, 27 de abril de 2024

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A corrupção no Brasil e o exemplo de Lincon

Recentemente tive o privilégio de assistir excelente filme em cartaz nos cinemas, a respeito de Lincoln (e este é o nome do filme; presidente dos EUA no Período da Guerra Civil naquele país). O ponto principal da trama baseada em fatos reais foi a Emenda Constitucional que aboliu a escravidão nos Estados Unidos da América, aprovada com muito esforço de Lincoln e que acabou lhe custando a vida. Seu pecado; não admitir a servidão.

Entre várias passagens interessantes do filme, trechos que me chamaram a atenção se referem ao fato deste Extraordinário Estadista ter utilizado métodos de compra de votos na chamada Câmara de Representantes para conseguir aprovar a Emenda para a extinção da escravatura.

Oportuna à lembrança histórica, pois, no Brasil se tem falado muito em compra de votos de parlamentares, corrupção, barganha de cargos públicos e outros fatores que ocorre a séculos no país, como se tratasse de algo novo.

Está, entretanto, ocorrendo uma desvirtuação ou confusão entre pessoas e os vícios do sistema. Explico.

O sistema político de cima a baixo se baseia em trocas promiscuas de favores e subornos e de longa data e nunca se apurou tanto quanto agora.

O que fazer com um congresso revestido de membros que insistem em buscar lucros para aprovar medidas, mesmo aquelas em benefício do país?

Até as pedras sabem que um parlamentar que gasta centenas de milhares ou milhões para ser eleito mediante financiamento privado de campanha precisará retribuir o favor.

Lincoln nos faz enxergar melhor o alcunhado e hipotético mensalão, termo inventado pelo criativo colega advogado Roberto Jefferson com sua acusação generalizada e focada em determinado grupo político. Irresponsavelmente o Deputado Jefferson quase comprometeu o futuro do país, transformado em herói por propaganda barata, mas monopolizada e incessante, lastreada pela intenção de desestruturar o Governo vigente.

O julgamento desse caso pelo STF após magnificas decisões em outros assuntos polêmicos (células tronco, união homoafetiva, cotas raciais, etc...) foi decepcionante. Focou-se de modo restrito a acusar pessoas específicas como uma espécie de aviso ou exemplo, ou seja, transmutou-se a sujeira do sistema que precisa ser reformado e que se arrasta assim à séculos para a figura dos Réus.

Pobre de Lincoln se fosse julgado pelo STF.

Não creio e não fui convencido de que tenha ocorrido algo como concluiu a maioria do STF, muito menos o chamado mensalão (termo folclórico).

Penso que o sistema político que os parlamentares insistem em não reformar gerou as ações de sempre, como o nítido apoio de bancada por cargos que ocorre às claras e se considera normal, suborno de lobistas, emendas dirigidas descaradamente, favorecimento em contratações (fato corriqueiro), não logrando o STF ter demonstrado de forma convincente o alegado mensalão, a despeito de elaborada construção lógica do relator, muito competente, porém, a meu ver com um Juízo pré-estabelecido de culpabilidade.

Para dar um exemplo, algumas condenações, se basearam no fato de que, pelo cargo ocupado a pessoa não teria como não saber ou compactuar com o crime. Ou seja, se em meu escritório, sua casa, sua empresa, seu emprego, alguém resolver cometer crimes e ocuparmos cargos de hierarquia mais elevada, presume-se que sabíamos e somos condenados, eis que, coniventes.

É um fundamento inaceitável que deve ser levado ao Juízo do povo, pois, todos estamos sujeitos a um dia promover ou responder processos e sermos julgados por pessoas (sem generalizar, mas existem muitos), que se avocam autorizadas a resolverem vidas por meras impressões ou intendo megalómano de punir a ponto de impingir penas absurdas com recurso a ser analisado por Tribunais que trabalham em volume humanamente impossível.

E agora tais julgadores, podem seguir o exemplo da mais alta corte do país e como advogado digo com absoluta tranquilidade que o Ministério Público (repisando que também não todos, mas muitos), processam criminalmente pessoas em grande parte das vezes com provas praticamente imprestáveis e uma peça processual absurda ou esdrúxula como a confeccionada pelo Procurador Geral da República que redigiu-a como quem não sabia de nada específico.

É frustrante observar uma propagação de frases de efeito, exigência de punições rigorosas em julgamentos que desrespeitam a Constituição sem que se fale do real problema que é o sistema político vigente. Inexiste a consciência de que a reforma política se impõe e que dar poderes a um Magistrado de julgar pelo que o mesmo deduz é a abertura do caminho para a contaminação do judiciário em retrocesso ditatorial ou de sua necessária limitação pelos outros poderes, pois, não pode admitir destruições de vidas por juízos mal formulados, o que é péssimo para a Democracia que precisa de um Judiciário forte, porém, não político e muito menos que prejudique de forma impetuosa os destinos da Nação.

Coloca-se um véu na imagem de sistema prostituído que vem desde os idos de Lincoln (citado aqui como exemplo e no Brasil não era/é diferente,) para sacrificar bodes expiatórios e denegrir de forma irresponsável a imagem de um Governo sólido, coeso e competente.

Que se puna o mal feito, mas com decência e clareza da conjuntura total.

Não precisamos de carrascos, necessitamos de uma firme reforma política que não obrigue quem Governa a ter que negociar com oposicionistas revestidos de pífia aparência de moralidade, propagadores de boatos de natureza moral e politiqueira, além dos corruptos que defendem a si próprios ou ao grupo que os financiam.

O povo não pode aceitar ser tratado como os antigos romanos, que eram aplacados com execuções, é necessário impedir que inimigos do bem comum continuem a manter os velhos hábitos do sistema, pois, sem à alteração da estrutura caros compatriotas, meia dúzia de julgamentos inquisitoriais e uma aparente rigidez antidemocrática não nos ajudará a atingir nosso destino Glorioso.

Confio no povo do qual faço parte e vi isso nas urnas. Não misturamos fatos pontuais com tentativas de generalizações absurdas e se viu que os votos foram conscientes, não prevalecendo hipócritas que avocam moralidade pelo fracasso de sua doutrina política.

Quanto aos advogados, certamente continuaremos lutando pela Democracia no âmbito judicial, pois, nós representamos o hipossuficiente perante o Estado, já o Ministério Público representa, me permitam a observação jocosa, o diabo nos ombros do Estado Juiz.

Dizem, mas não foi provado que a autorização de candidatura a reeleição do Presidente do Real (FHC) fora feita mediante acordos prostituídos no congresso. Se a reeleição naquele momento era boa para o país (e era uma opinião aceitável à época, apesar de pessoalmente eu sempre ter discordado de tratar de economia como meros números e especulações) quem exigiu favores para votar consiste no maior traidor da Pátria e quem fez os acordos porque era preciso pelo objetivo maior, precisa refletir: ou muda-se o sistema ou terá de negociar com esse tipo de pessoas tal como Lincoln teve de fazer.


Abenur Amurami de Siqueira é Advogado Militante (OAB/MT).

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