O Ministério Público do Estado (MPE) se manifestou, novamente, pela manutenção da sentença que pronunciou o advogado Luiz Eduardo Figueiredo da Rocha e Silva ao júri popular pelo homicídio de Ney Alves Muller, assassinado em abril, na capital. Em parecer assinado nesta segunda-feira (13), o promotor Samuel Frungilo rebateu todos os argumentos da nova defesa de Luiz, inclusive o laudo apresentado por um perito do Paraná.
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Homem em situação de rua e dependente químico, Ney foi assassinado com um tiro na cabeça no dia 9 de abril de 2025, por volta das 21h, nos muros da Universidade Federal de Mato Grosso, bairro Boa Esperança, capital.
Frungilo respondeu recurso em sentido estrito movido em setembro. Os argumentos da nova defesa de Luiz, que também era procurador da Assembleia Legislativa, foram os mesmos dos anteriormente apresentados: que ele reagiu a em legítima defesa a uma ameaça de Ney.
Para isso, apresentou um laudo pericial elaborado por um perito do Paraná. Nas 29 páginas, a conclusão foi que Ney, que estava portando apenas um short e um chinelo, realizou um movimento abrupto e agressivo em direção à janela aberta do carro do réu, sugerindo tentativa de ataque ou invasão. Concluiu também que o disparo foi uma reação imediata e instintiva a uma ameaça iminente, reforçando a tese de legítima defesa e contradizendo a premeditação ou a impossibilidade de defesa da vítima.
Diante disso, provocou o Tribunal de Justiça pedindo a anulação da decisão de pronúncia que o submeteu a júri popular pelas qualificadoras de motivo torpe e recurso que dificultou a defesa da vítima. Os advogados também alegam nulidade processual devido à violação da plenitude de defesa, falta de fundamentação na decisão de pronúncia e, crucialmente, a ilicitude da prova digital por quebra da cadeia de custódia.
O promotor contestou lembrando que o vídeo em questão foi disponibilizado às partes desde a parte investigativa do caso, e que essa prova jamais foi impugnada, inclusive, o próprio perito paranaense atestou que “as imagens não possuem indícios de truncagem, cortes ou edições, bem como que os registros possibilitam uma análise tecnicamente segura dos acontecimentos mostrados nos vídeos”.
Luiz também argumenta suposta contradição entre o laudo de necrópsia (disparo "à distância") e a narrativa acusatória (disparo "à curta distância" ou "à queima roupa"), para desqualificar a surpresa e a dinâmica do ataque.
No entanto, o promotor reafirma que a materialidade e autoria delitiva foram comprovadas por diversas provas, incluindo boletim de ocorrência, depoimentos, interrogatório do acusado, laudos periciais (necrópsia, balística, imagens) e que a decisão de pronúncia mencionou o laudo de necrópsia, que atestou a morte por traumatismo crânio encefálico causado por disparo de arma de fogo à distância na cabeça.
Ainda sobre o novo laudo da defesa, o promotor anotou que se trata de meio de prova de natureza privada, cujo valor probatório é limitado e deve ser apreciado em conjunto com os demais elementos, bem como que "causa estranheza o fato de o expert extrapolar os limites de sua atuação, emitindo juízos de valor e avaliações de cunho subjetivo que não se coadunam com a imparcialidade e a objetividade que se espera de um parecer técnico. Tal circunstância compromete, em certa medida, a credibilidade do documento, que passa a assumir contornos argumentativos típicos de peça defensiva, distanciando-se de sua finalidade “pericial”.
O promotor enfatizou que o elemento surpresa não foi baseado em um disparo à queima-roupa, mas na dinâmica delituosa: Luiz “caçou” Ney após este danificar seu carro momentos antes, achou a vítima na principal avenida no bairro Boa Esperança e a chamou, momento em que abaixou o vidro do carro e efetuou o disparo imediatamente, em menos de 5 segundos, sem que ele tivesse chance de defesa, como evidenciado pelas imagens de câmeras de segurança.
A tese de legítima defesa, baseada na suposta agressão ou investida súbita da vítima contra o veículo, foi afastada por ser frágil e duvidosa, sem comprovação de uso moderado dos meios, e a própria narrativa do acusado, que portava a arma entre as pernas e chamou a vítima. Argumentos sobre a posição de Ney (agachado e inclinado) e o trajeto descendente do projétil foram considerados compatíveis com a dinâmica narrada pela acusação e não desconstroem a surpresa.
Frungilo ainda retrucou o fato de que Luiz teria procurado as autoridades antes de “caçar” Ney. O promotor demonstrou que a defesa não conseguiu comprovar a alegação do próprio advogado, de que ele buscou a polícia duas vezes sendo a primeira através de uma viatura que estava localizada no viaduto do shopping Três Américas e a segunda na base da Polícia Militar do Boa Esperança.
“A defesa assim não o fez simplesmente porque não é verdade. Do contrário: pelas provas produzidas, tanto em sede policial como em juízo, resta evidente que o objetivo do acusado não era o de acionar as autoridades, mas sim de encontrar e punir o responsável pelos danos em seu veículo, nos termos narrados na exordial acusatória”, anotou o promotor.
De acordo com a acusação, o caso começou quando o veículo Land Rover de Figueiredo foi danificado por Ney Müller no Posto Matrix. Após ser informado por testemunhas sobre as características do autor, o advogado jantou com a família no restaurante do posto e saiu cerca de meia hora depois.
Após levar os familiares para casa, ele teria retornado à região em busca do responsável pelos danos. Segundo a denúncia, iniciou uma “caçada à vítima” e encontrou Ney Müller caminhando pela calçada da avenida. De dentro do carro, com os vidros abaixados, chamou a atenção do homem e efetuou um disparo de arma de fogo no rosto dele, a curta distância. A vítima morreu na hora.
A arma utilizada, uma pistola Taurus .380, era registrada e tinha porte legal em nome do acusado. Após o disparo, Figueiredo deixou o local.
O pormotor classificou o crime como motivado por “vil sentimento de vingança”. A denúncia ressalta a vulnerabilidade da vítima, em situação de rua, possivelmente portadora de esquizofrenia e sem condições de reparar o dano material. Também apontou que o disparo foi efetuado de forma inesperada, sem chance de defesa.
Luiz segue preso na Cadeia Pública de Rondonópolis enquanto move recursos tentado atrasar sua submissão ao júri, decretada pela sentença de pronúncia proferida em agosto.