O juiz Moacir Rogério Tortato manteve a tornozeleira eletrônica instalada nos empresários e advogados alvos da Operação Sepulcro Caiado, que apura desvio milionário da conta única do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT). Na mesma ordem, proferida na última sexta-feira (29), o magistrado flexibilizou parte das outras medidas cautelares impostas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em alternativa à prisão, como a autorização para deslocamentos por trabalho e contato com familiares.
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Irmão de João Ricci Volpato, Augusto é acusado de movimentar quantias expressivas na conta de sua esposa em nome das empresas de João. Ele chegou a ser preso em julho, mas foi solto por ordem do STF. Ao juízo de primeira instância, requereu permissão de contato com familiares investigados, sobretudo sua mãe Luiza Volpato, e o cunhado Guilherme Corral, e a alteração das restrições de deslocamento para fins profissionais. Ambos foram deferidos em virtude de laços familiares e necessidade de trabalho monitorado.
O juiz Moacir Tortato também reconheceu o cumprimento da entrega de passaportes pelo casal de advogados Wagner e Melissa Vasconcelos, mas ressalta a pendência de outras medidas cautelares, como o não comparecimento mensal em juízo e a pendência de instalação da tornozeleira.
A empresária Denise Alonso e seu esposo, o advogado Regis Poderoso (
irmão de um promotor do Ministério Público de Mato Grosso), requisitaram permissão para viajarem e realizarem a mudança da instalação da tornozeleira, visto que foram alvos da ofensiva em São Paulo, o que foi concedido pelo juiz.
Tortato ainda examinou pedidos de restituição de bens feitos por Guilherme, que visou de volta sua caminhonete Ford Ranger, e da servidora Claudia Regina Dias de Amorim Corrêa, que postulou dois celulares e um Corolla. Contudo, antes de decidir sobre isso, o magistrado solicitou manifestação da autoridade policial e do Ministério.
Por fim, o juiz ressaltou que as demais cautelares, como o monitoramento eletrônico, continuam efetivas e intimou as respectivas defesas para que, em cinco dias, apresentem informações sobre do cumprimento de todas as obrigações impostas pelo Supremo, sobretudo quanto ao comparecimento mensal em juízo, entrega dos passaportes e utilização de tornozeleira eletrônica.
Os acusados
A Sepulcro Caiado foi deflagrada no final de julho e culminou na prisão de Wagner Vasconcelos de Moraes. Melissa Franca Praeiro Vasconcelos de Moraes, João Gustavo Ricci Volpato, Luiza Rios Ricci Volpato, Augusto Frederico Ricci Volpato, Rodrigo Moreira Marinho, Themis Lessa da Silva, João Miguel da Costa Neto, Régis Pederoso de Souza, Denise Alonso e o servidor Mauro Ferreira Filho. Todos tiveram habeas corpus concedido pelo Supremo e, agora, respondem ao processo penal cumprindo cautelares.
O empresário João Gustavo Ricci Volpato, ex-secretário municipal de Habitação de Cuiabá, é apontado como um dos líderes do grupo criminoso acusado de desviar milhões da conta única. Além de Volpato, que está preso, também foram detidos preventivamente Rodrigo Marinho, outros advogados e familiares do ex-secretário.
João Gustavo Ricci Volpato teria usado empresas sob seu controle, como a RV Empresa de Cobrança LTDA, para ajuizar execuções judiciais baseadas em dívidas inexistentes. Segundo investigações, os processos eram patrocinados pelo escritório França & Moraes, de Wagner Vasconcelos de Moraes e sua sócia e esposa, Melissa França Praeiro.
Rodrigo Moreira Marinho, suplente no Conselho da OAB-MT, também foi preso. Ele atuou em processos com indícios de acordos superfaturados e renúncia fraudulenta a prazos recursais. Uma vítima relatou que R$ 150 mil foram "pagos judicialmente" em seu nome, sem que ela tivesse condições financeiras para isso.
Flávia de Oliveira Volpato, por sua vez, esposa de João Volpato, aparece como coadquirente de imóvel no valor de R$ 37.521,82, com pagamento em espécie, fato que, aliado ao histórico investigativo do cônjuge, apontou para a tentativa de ocultação patrimonial e fuga à rastreabilidade bancária.
Régis, que também é servidor da Assembleia Legislativa, é acusado de advogar em cinco ações fraudulentas do esquema de desvio, sem sequer ter tido o pode outorgado pelas partes, ajuizadas da mesma forma, o que indicou possível “padronização fraudulenta”, indícios de falsidade ideológica e associação criminosa. Além disso, ele é acusado de comprar um imóvel em Marília-SP, com dinheiro vivo, e ter movimentado R$ 220 mil em um mês, e que ele fazia pagamentos em espécie à João Gustavo Ricci Volpato, empresário acusado de liderar o esquema.
Ainda segundo a Operação, Denise Alonso revezaria representações fraudulentas em processos com Régis, ora como advogada da parte exequente, ora como parte de parte executada, mesmo sem a devida outorga de poderes. Eles agiriam desta forma para firmarem acordos judiciais com valores expressivos provenientes das fraudes.
Themis Lessa da Silva, outro advogado investigado, aparecia como representante de devedores em ações movidas por Volpato, mesmo sem procuração válida. Vítimas afirmam nunca tê-lo contratado, e assinaturas em documentos seriam falsificadas. Em pelo menos dois processos, sequer havia mandato nos autos.
Em relação à Júlia Maria Volpato, esposa de Augusto Frederico Ricci Volpato, advogado e familiar de João, a operação apresentou indícios de que sua conta bancária foi utilizada para ocultar dinheiro ilícito diante do recebimento direto, no montante de R$ 132.725,00, entre 2021 e 2023, em transferências recorrentes oriundas do cônjuge. Júlia é filha de Joani Maria de Assis Asckar, tabeliã do Cartório do 6º Ofício de Cuiabá.
Sobre Guilherme Porto Corral, concunhado de Augusto, apurou-se que este realizou transações superiores a R$ 1 milhão em favor do investigado, sem que haja vínculo econômico ou jurídico conhecido entre ambos. Tal circunstância aponta para o possível uso da conta de Guilherme como interposta pessoa no esquema de lavagem de dinheiro.
No que diz respeito à Keyyly Gonçalves Martinez, a operação identificou que sua conta bancária movimentou R$ 3.5 milhões, sendo destinatária de transferências de R$ 270.000,00 oriundas da conta de Augusto Volpato, , além de valores de empresas ligadas diretamente ao grupo investigado, como a RV Cobrança – propriedade de João.
“As movimentações, realizadas em curto intervalo de tempo e sem lastro contratual evidente, indicam a possível utilização de sua conta como elo de triangulação e dispersão de valores ilícitos”, diz outro trecho das investigações.
O modus operandi
O grupo simulava quitações de dívidas para obter alvarás de levantamento de valores. Servidores do TJMT, como Mauro Ferreira Filho, teriam facilitado a vinculação ilegal de recursos de outros processos à conta única. O Banco do Brasil confirmou que comprovantes de depósito usados eram falsos, com numerações inválidas e datas inconsistentes.