O ministro Mauro Campbell Marques, relator de uma reclamação disciplinar no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) contra o desembargador João Ferreira Filho, revelou um diálogo que aponta uma possível negociação de decisão judicial. O advogado Roberto Zampieri, assassinado em dezembro de 2023, teria recebido uma tarefa do empresário e lobista Andreson de Oliveira Gonçalves: "pergunta se dá e qual o valor". A mensagem teria como destinatário o desembargador João Ferreira.
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Segundo Campbell, o pedido foi seguido da recomendação de que o processo em questão fosse distribuído por prevenção ao desembargador João Ferreira Filho.
“Ao final, a despeito de o feito ter sido liminarmente decidido por Sebastião de Barbosa Farias, atuando em substituição, João Ferreira Filho não hesitou em reconsiderar a decisão”, afirmou o ministro durante a sessão que julgou a reclamação disciplinar.
Ainda conforme o relator, ao atender os interesses de Andreson, Zampieri teria perguntado ao lobista se conseguiria "aquele valor pela manhã", o que, segundo Campbell, reforça a suspeita de que a decisão foi proferida mediante o pagamento de vantagem indevida.
Abertura de Processo Disciplinar
Em decisão unânime, o Plenário do CNJ determinou a instauração de processo administrativo disciplinar (PAD) contra o desembargador João Ferreira Filho, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), investigado por suposto envolvimento em um esquema de venda de sentenças.
O julgamento, realizado nesta terça-feira (5), está relacionado à apuração dos vínculos entre o magistrado e o advogado Roberto Zampieri, morto a tiros em dezembro de 2023, em Cuiabá. Ferreira é suspeito de proferir decisões judiciais mediante pagamentos sistemáticos e reiterados de vantagens indevidas intermediadas por Zampieri e outras pessoas.
A principal base das suspeitas é a troca de mensagens entre o desembargador e o advogado fora dos canais oficiais do tribunal. Nesse sentido, o CNJ rejeitou a alegação de ilegalidade na obtenção do conteúdo extraído do celular de Zampieri, uma vez que o acesso se deu com autorização da família.
De acordo com Campbell, a suspeita se sustenta em pelo menos cinco elementos:
- Diálogos comprometedores apreendidos no celular do advogado, que indicam não apenas uma relação incomum de proximidade, como também o pagamento de propina para decisões judiciais;
- Gastos incompatíveis com a renda formalmente declarada pelo magistrado;
- Despesas elevadas em cartão de crédito;
- Aquisição de imóveis por valores superiores aos declarados no imposto de renda, além da existência de bens não declarados;
- Recebimento de valores por meio da esposa e da filha.
Além de autorizar a abertura do PAD, o CNJ manteve o afastamento cautelar do desembargador, já determinado em agosto de 2024.