Relatório de constatação prévia elaborado pela AJ1 Administração Judicial revela que o Grupo Safras, responsável por protocolar um robusto pedido de recuperação judicial na Comarca de Sinop, com passivo superior a R$ 2,2 bilhões, não conseguiu comprovar de forma plena o cumprimento dos requisitos legais exigidos pela Lei 11.101/2005. A perícia foi determinada pela 4ª Vara Cível após dúvidas quanto à regularidade da documentação apresentada pelas empresas e produtores rurais ligados ao grupo.
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O parecer técnico da AJ1 aponta que, embora a maior parte da documentação tenha sido protocolada e algumas exigências atendidas, permanecem inconsistências e pendências relevantes, o que impede uma validação automática da solicitação e transfere ao Judiciário a responsabilidade de decidir sobre a admissibilidade da recuperação.
“Apesar de grande parte das exigências legais ter sido atendida, remanescem determinados esclarecimentos e justificativas relacionados no próprio decisum”, pontua a AJ1, referindo-se à decisão judicial que determinou a constatação prévia.
Entre os problemas identificados, estão empresas recém-criadas com atividade inferior ao período mínimo legal de dois anos, como a Agro Rossato Ltda. e D&P Participações, além de holdings sem faturamento ou com objeto social incompatível com suas funções de controle patrimonial.
“Verifica-se que a Agro Rossato Ltda. não cumpre formalmente com o requisito previsto no art. 48 da LRF, não apresenta faturamento registrado no período analisado e não tem a atividade de holding indicada em seu objeto social”, descreve a perita responsável pelo levantamento.
Além disso, documentos contábeis essenciais foram entregues sem assinatura, e houve divergências entre balanços, livros caixa digitais (LCDPR) e declarações de imposto de renda. Em alguns casos, produtores rurais indicaram que suas movimentações foram realizadas “em nome do cônjuge”, o que complica a comprovação formal da atividade empresarial individual exigida pela legislação.
“A requerente Stella Mari Bonatto deixou de apresentar objetivamente a totalidade da documentação exigida pelo §3º, artigo 48 da LRF”, aponta o laudo, alertando que a aceitação de sua inclusão no polo ativo dependerá da interpretação do juízo quanto à possibilidade de utilizar dados do marido para validar sua condição de produtora rural.
A AJ1 também destacou que algumas empresas declararam estar sem operação, terem vendido ativos a instituições financeiras como o BTG Pactual, ou ainda enfrentarem situação cadastral paralisada junto à Secretaria de Fazenda do Estado de Mato Grosso.
Em diversos trechos, a perícia adota tom de cautela. Embora não afirme de forma categórica a impossibilidade de deferimento, coloca a necessidade de deliberação judicial diante da não comprovação completa da documentação legal mínima:
“O cumprimento da presente exigência pende de deliberação judicial quanto à possibilidade de utilizar as demonstrações do requerente Pedro [de Moraes Filho] para comprovar a atividade rural”, resume a administradora judicial.
A perícia não identificou, por ora, indícios evidentes de fraude, mas recomendou atenção especial ao juiz do caso, diante da complexidade societária e das operações envolvendo fundos de investimento com cláusulas de confidencialidade, como Axioma e Alcateia.
A decisão final sobre o processamento da recuperação judicial, portanto, está nas mãos do Judiciário, que deverá ponderar entre a preservação das atividades e o cumprimento estrito da legalidade.
“Este trabalho foi elaborado com a finalidade específica de indicar o atendimento dos requisitos elencados nos artigos 48 e 51 da Lei nº 11.101/2005”, destaca a perita, frisando que não se trata de auditoria contábil, mas de uma análise de regularidade documental e de funcionamento mínimo das empresas.