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Quinta-feira, 28 de março de 2024

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Justiça condena fazenda a pagar R$ 100 mil e pensão à família de trabalhador vítima de leishmaniose

Foto: Rogério Florentino Pereira/Olhar Direto

Justiça condena fazenda a pagar R$ 100 mil e pensão à família de trabalhador vítima de leishmaniose
A Justiça do Trabalho reconheceu que a leishmaniose contraída por um operador de máquinas agrícolas se deu em razão do trabalho que ele desenvolvia para um grupo de fazendas (Mato limpo, Porto Feliz e Águas Claras) no interior de Mato Grosso. Reconheceu também que a doença contribuiu para a morte do trabalhador, condenando os empregadores a pagar indenização por dano moral no valor de R$ 100 mil e pensão à companheira e filho da vítima.

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A decisão dada pela 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho (TRT/MT) mantém sentença proferida na Vara do Trabalho de Sapezal. A conclusão nos dois julgamentos foi que a enfermidade foi adquirida pelo operador de máquinas em decorrência do seu serviço, de desmate de floresta, realizado em uma região endêmica.  

A leishmaniose tegumentar é uma doença crônica que atinge pele e mucosas, sendo transmitida pela picada de mosquito do gênero Lutzomia, com período de incubação média de um mês, podendo chegar até a um ano, conforme esclareceu a médica perita que atuou no caso. Ainda segundo a especialista, a patologia é encontrada com frequência em trabalhadores agrícolas ou florestais de zonas endêmicas, estando os maiores focos encontrados na fronteira sul da Amazônia e na região de Foz do Iguaçu, no Rio Grande do Sul.

No recurso ao Tribunal, os empregadores pediram a reanálise do caso sob o argumento que a doença apenas foi diagnosticada em janeiro de 2016, o que seria possível deduzir que ela foi contraída em dezembro de 2015, quando o contrato com o trabalhador já estava encerrado. Alegaram também que desde o primeiro afastamento previdenciário, em 2014, o empregado não voltou a morar em área rural, passando por diversas outras cidades, como Cuiabá, Tangará da Serra e Vila Bela da Santíssima Trindade, o que impossibilitaria precisar o local em que a enfermidade foi adquirida.

Acidente de trabalho equiparado

Entretanto, a 1ª Turma concluiu, acompanhando o relator do recurso, desembargador Paulo Barrionuevo, que a doença está relacionada às atividades desenvolvidas em benefício das fazendas, o que caracteriza a ocorrência de acidente de trabalho equiparado.

Conforme registrou o relator, o laudo pericial revela que, apesar do diagnóstico definitivo ter sido dado em 2016, o trabalhador estava acometido da doença pelo menos desde 2007, quando já apresentava os sintomas da leishmaniose, como lesões na região da garganta (orofaringe) e palato mole, com quadros de agravamentos intercalados a melhoras clínicas.

Documentos juntados ao processo detalham as várias internações em hospitais de Cuiabá, e até em Cascavel, no Paraná, com a realização de diversos procedimentos e exames médicos, todos inconclusivos, até que, nove anos depois dos primeiros sintomas, uma biópsia chegou ao diagnóstico definitivo. Entretanto, anos antes da certeza médica, tendo em vista o histórico e parâmetros clínicos, o tratamento utilizado passou a basear-se na provável existência de leishmaniose que, ao fim, mesmo com as intervenções médicas, evoluiu para o óbito.

Quanto à alegação da defesa de que a doença poderia ter sido contraída fora do ambiente de trabalho, o relator ponderou que o fato da família do empregado não ter se infectado leva a se presumir que o vetor não estava presente no ambiente doméstico, onde sua esposa e filho passavam mais tempo e, dessa forma, acabariam sofrendo a picada do mosquito.

Doença ocupacional

A Turma entendeu, ainda que, mesmo que se trate de uma doença endêmica, ficou comprovado o nexo de causa entre a enfermidade e o serviço, na medida em que as condições de trabalho no meio rural potencializam a infecção.

Nesse sentido, o perfil ocupacional da doença é citado constantemente para o caso dos trabalhadores agrícolas ou florestais, especialmente quando atuam em desmatamento, “na medida em que o homem se insere em locais que até então possuíam vegetação nativa, passando a fazer parte do ciclo da doença (como hospedeiro).”, explicou o relator.

O magistrado ressaltou que a extração de madeira de floresta plantada (produção florestal) é o caso típico em que a chance de contato com o transmissor da leishmaniose é acima da média. A extração de madeira é classificada como grau de risco 03 (em uma escala que vai até 4) pela Norma Regulamentadora 4 do extinto Ministério do Trabalho e Emprego (atual Secretaria Especial de Previdência e Trabalho).

Desse modo, incide sobre o caso a responsabilidade objetiva, aplicada nas situações em que o dano é potencialmente esperado em razão da natureza dos serviços que demandem um grau de risco superior ao que está sujeita a maioria das pessoas em seu cotidiano.

Mas, mesmo sob o ponto de vista subjetivo, os empregadores são responsáveis pelo ocorrido, salientou o relator, por conta da negligência quanto à higiene, segurança e saúde no trabalho com seus empregados, que trabalhavam sem equipamentos de proteção (EPIs) e sem fazer os exames exigidos.  “(...) os Réus não apresentaram os exames médicos admissionais e periódicos estipulados pelo art. 168 da CLT, com os quais os casos de leishmaniose poderiam ser diagnosticados de forma precoce, também não comprovaram a entrega de EPIs, nem elaboraram PCMSO e PPRA”, listou o relator.

Pensão e dano moral

A 1ª Turma modificou, no entanto, o valor da reparação pelo dano moral. Levando em consideração o montante fixado na maioria das decisões do Tribunal em casos envolvendo acidente de trabalho com morte do empregado, os julgadores reduziram a importância de 150 mil reais para R$ 100 mil.

A decisão manteve a determinação da sentença de pagamento de pensão à família, sendo que no caso do filho isso vai até ele completar 25 anos de idade.
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