A Vara Especializada de Meio Ambiente de Cuiabá desconsiderou o pedido das Ações Civis Públicas movidas pelo Ministério Público de Mato Grosso, de multa de cerca de R$ 3 bilhões, contra a Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja) e 13 produtores que participaram da pesquisa agrícola científica conduzida pela Fundação Rio Verde e Instituto Agris, para avaliar o melhor período de plantio de semente para uso próprio, não adentrando no vazio sanitário. O valor acabou sendo reduzido para uma média de R$ 57,6 mil por experimento.
Leia mais:
Promotora pede condenação da Aprosoja e 14 produtores rurais por litigância de má-fé
Na última terça-feira (13), a sentença, julgada procedente, condenou as partes ao pagamento do valor correspondente ao volume das sementes colhido nos experimentos, bem como ao valor a título de dano ambiental coletivo em R$ 57,6 mil por experimento (em média). Aprosoja e os produtores vão aguardar a publicação da decisão e avaliar juridicamente se irão recorrer.
"Destarte, entendo proporcional e razoável a fixação do dano extrapatrimonial ambiental coletivo n o valor correspondente a R$1.000,00 (mil reais) por hectare de área plantada irregularmente, uma vez que melhor representa os critérios de fixação acima consignados (extensão e reparação do dano; fator de dissuasão para novas condutas; e medida socioeducativa)", diz trecho da decisão.
A indenização é muito inferior ao que foi pedido pelo Ministério Público, que queria R$ 3 bilhões. Ainda segundo a decisão, após o pagamento pelo volume da soja produzido nos experimentos, o mesmo poderá ser levantado e utilizado na condição de soja em grão comercial pelos produtores.
Aprosoja afirmou que respeita a decisão, porém segundo a entidade, a sentença não levou em consideração a validade do Acordo de Mediação assinado pela Superintendência Federal do Ministério da Agricultura (SFA), pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema), e pelo Instituto de Defesa Agropecuária de Mato Grosso (Indea-MT), que autorizou a pesquisa científica dos plantios experimentais.
“O Juízo do Meio Ambiente levou em consideração os argumentos do Ministério Público e da Procuradoria Geral do Estado (PGE), de que o acordo não era válido, pois não teria tido a participação deste último órgão na Mediação. Todavia, a PGE não somente tomou assento na primeira sessão da Mediação, mas também, por meio da Subprocuradoria-Geral de Defesa do Meio Ambiente, tomou ciência do procedimento, e manifestou no sentido de ser completamente desnecessária a manifestação da PGE, recomendando a participação da Sema, Secretaria esta, que também assinou a autorização para os plantios experimentais”, explicou a associação.
Além disso, segundo a Aprosoja, “nem a PGE e nem o Indea-MT tinham competência para anularem, por eles mesmo, o acordo de Mediação, como foi feito. Isto porque, a Lei Complementar nº 111/2002, em seu Artigo 8º, determina que essa atribuição seria somente do Governador do Estado”.
A Associação e os produtores que participaram da Pesquisa ainda avaliam a possibilidade de recurso da sentença da Vara do Meio Ambiente, especialmente, porque o dano ambiental coletivo não ficou provado, conforme a associação defende.
“A presença de ferrugem-asiática nos experimentos foi mínima, se comparado aos plantios de dezembro, não sendo suficientes para demonstrar o dano que poderia advir com os plantios de semente para uso próprio em fevereiro. Somente uma Perícia Técnica poderia trazer segurança para o Juízo e para as partes sobre a constatação ou não desse dano. Todavia, esta prova, requerida pela Aprosoja, foi cerceada na sentença, o que pode ensejar a nulidade desta decisão”, afirmou a Entidade.
Ainda segundo aponta a Associação, outro argumento que não foi levado em conta na sentença foi o fato de a Aprosoja ter chamado ao processo o Estado de Mato Grosso, como responsável solidário pelos experimentos, e por qualquer possível indenização nas Ações Civis Públicas.
“O Estado de Mato Grosso é responsável não só pelos experimentos, mas também pela indenização da sentença do Juízo de Meio Ambiente, já que autorizou os plantios da pesquisa. Aliás, isto já está firmando, inclusive, na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1071741/SP)”, continua.
Por fim, a Aprosoja ressalta que a Instrução Normativa Conjunta SEDEC/INDEA-MT nº 002/2015, que embasou as Ações Civis Públicas do Ministério Público, é nula.
“Esta Instrução Normativa, que calendarizou o plantio da soja no estado em 31 de dezembro, é nula de pleno direito, isto porque, não respeitou as normas gerais do Ministério da Agricultura, bem com a Lei Nacional de Política Agrícola, e a regulamentação do Sistema Unificado de Atenção à Sanidade Agropecuária (SUASA). Esta Instrução Normativa, sim, deveria ser anulada unilateralmente pelo estado, já que unilateralmente foi criada, não respeitando a Lei”, finaliza a Aprosoja.
O recurso que ainda será analisado juridicamente pela Aprosoja e pelos produtores contra a sentença do Juízo do Meio Ambiente, caso interposto, é Apelação, disciplinada no Código de Processo Civil, e tem efeito suspensivo, ou seja, qualquer efeito da sentença somente poderá ser gerado após o tramite deste recurso.
A pesquisa
Segundo a Aprosoja, a insatisfação dos produtores com a baixa qualidade e vigor das sementes de soja comercial levou os agricultores a produzirem sua própria semente, bem como embasou a busca pela pesquisa, que foi iniciada após acordo firmado com o Indea, Mapa, Sema, Fundação Rio Verde e Instituto Agris, por meio da Câmara de Mediação (Amis).
Conforme os produtores, o atual calendário de plantio determinado pelo Estado, para até 31 de dezembro, além de necessitar maiores aplicações de agrotóxico, devido período chuvoso, compromete a qualidade da semente e a sustentabilidade do meio ambiente. A proposta da pesquisa é respaldar que a melhor época para o plantio e produção de semente seria o mês de fevereiro, e não dezembro, como vem sendo feito.
De acordo com o engenheiro agrônomo, pesquisador e professor doutor Erlei Mello Reis, do Instituto Agris, e a Fundação Rio Verde, seria necessária a aplicação de 50% menos de defensivos agrícolas neste período. Um estudo sobre isso foi realizado no ano passado.
“Com as observações corretas e o uso estatístico demonstramos que na lavoura de fevereiro, como esperado, o número de aplicações foi de quatro por hectare, e em comparação com a de dezembro nós chegamos a uma média de oito aplicações por hectare. Arredondando, houve uma redução de 50% de incidência ou da severidade da ferrugem, traduzindo em um número de menor aplicações de defensivos agrícolas”, explicou o pesquisador.
O presidente da Aprosoja avaliou que a decisão do Indea, que proibiu a continuação da pesquisa após seu início, ocorreu por pressão de setores que podem ser prejudicados com a mudança na data do plantio. Segundo ele, o período que o Estado escolheu (dezembro) beneficia dois grandes grupos econômicos, o de defensivos agrícolas e o sementeiro (obtentores e multiplicadores).