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Quinta-feira, 28 de março de 2024

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Piadas em programa

Defensoria pede indenização de R$ 100 mil a apresentador de TV após atos homofóbicos

Foto: Reprodução

Defensoria pede indenização de R$ 100 mil a apresentador de TV após atos homofóbicos
A Defensoria Pública de Mato Grosso ingressou com uma ação civil pública (ACP) contra a TV Nativa, afiliada da TV Record em Alta Floresta, na pessoa de sua sócia-proprietária, Vera Lúcia Cardoso, e Welerson de Oliveira Dias, apresentador de TV e radialista no município, solicitando uma indenização de R$ 100 mil por dano moral coletivo contra a comunidade LGBTI.
 
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No dia 17 de junho, de acordo com a ação, Welerson de Oliveira Dias, durante apresentação do programa Olho Vivo, imitou o defensor público que atua na comarca, Vinicius Ferrarin Hernandez, fazendo piadas homofóbicas sobre sua orientação sexual.
 
A ACP foi impetrada nesta segunda-feira (29) pelo defensor público-geral, Clodoaldo Queiroz, e pelo defensor público Carlos Eduardo de Souza. Na ação, a Lei n.º 7.716/89 e a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) são citadas ao evocar o dever do Estado de inibir condutas discriminatórias "que, a pretexto de entreter o público, causam humilhação e atentam contra a dignidade das minorias".
 
Os autores também refutam a tese de que a liberdade de expressão possa ser invocada para eximir atos discriminatórios. "Em que pese o direito de liberdade de expressão ser constitucionalmente garantido, tal direito não é absoluto e deve ser exercido em observância à proteção à dignidade da pessoa humana. Não se pode deliberadamente agredir e humilhar, ignorando-se os princípios da igualdade e isonomia, com base na invocação à liberdade de expressão", diz trecho da ação.
 
Segundo o defensor público-geral, a liberdade de expressão é assegurada a todos, mas vem junto com a responsabilidade que devemos ter por tudo aquilo que falamos. "A humilhação pública divulgada em emissoras de rádio e televisão, atentando contra a dignidade de todas as pessoas que se identificam como LGBTI, causou dano coletivo à honra desse grupo já tão vulnerabilizado e, por isso, iremos buscar, em nome de todos eles, a devida reparação", garantiu Queiroz.
 
"A Defensoria Pública, enquanto instrumento constitucional de proteção à dignidade da pessoa humana, não pode admitir que ofensas grotescas e vexatórias como as que foram propaladas contra uma parte da população que, segundo estimativas imprecisas, engloba entre 10 e 20 milhões de pessoas, possam ser praticadas impunemente", repudiou.
 
A ação de combate à homofobia ocorre justamente na Semana de Diversidade Sexual, que vai de 29 de junho ao dia 3 de julho, em alusão ao Dia Internacional do Orgulho LGBTI (sigla para lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e intersexo), celebrado no último domingo (28), que normalmente é marcado por paradas que tomam as ruas no mundo todo, mas ficou restrito às redes sociais este ano, por conta da pandemia de Covid-19.
 
"A Defensoria Pública não poderia se furtar, na Semana da Diversidade Sexual, de coibir que isso pudesse ocorrer. Então, buscamos todas as imagens e declarações para que houvesse a propositura da ACP visando inclusive a reparação civil em relação à TV, que propagou essa mensagem subversiva à homossexualidade, bem como pugnando pela cominação de indenização por danos morais coletivos", ressaltou o defensor Carlos Eduardo de Souza.
 
A Defensoria Pública de Mato Grosso tem tradição na luta contra a homofobia. Em março de 2019, o ex-deputado-federal Victório Galli Filho (PSL) foi condenado a pagar R$ 100 mil por danos morais e coletivos após ação civil pública proposta pela DPMT. De acordo com a decisão da juíza Célia Vidotti, o dinheiro será destinado a uma entidade sem fins lucrativos em Cuiabá que atue em prol da comunidade LGBT.
 
Atitude homofóbica
Segundo o documento, o apresentador Welerson Dias demonstra clara intenção difamatória e postura homofóbica ao comparar sua fala e seus gestos com a entrevista do defensor público Vinicius Hernandez, concedida à TV no dia 15 de maio, em vídeo gravado e disponibilizado à emissora, não só pela reprodução das palavras, mas também pela entonação e trejeitos.
 
Embora tenha pedido que a entrevista fosse reproduzida na íntegra, o vídeo foi editado pela TV ao ser veiculado no programa Balanço Geral, que é transmitido, ao vivo, pela televisão e pelos canais no YouTube e Facebook da emissora.
 
A ação narra que fica evidente que Dias estava imitando o defensor público, em tom jocoso, desrespeitoso e homofóbico, ao analisar trecho da entrevista dolosamente não veiculado pela emissora de televisão, mas que consta no vídeo enviado pelo defensor.
 
"Da 'atuação' do apresentador, percebe-se, inclusive, que tal imitação é 'brincadeira' comum entre os membros da televisão, que excedem todo o tipo de responsabilidade jornalística para pessoalizar a discussão e ganhar visualizações, tratando com desrespeito e desprezo toda a comunidade LGBTI", diz trecho da ACP.
 
Não satisfeito, no dia seguinte (18), em seu programa de rádio, Dias imitou novamente o defensor público, em mais uma demonstração de desapreço pela dignidade da comunidade LGBTI.
 
"(Radialista faz voz feminina em tom jocoso) Ai, ai que tem que liberar porque é o princípio da dignidade humana (...)", para depois, em tom de ameaça e mudando completamente o timbre de voz, disparar: "Dignidade da pessoa humana para os seres humanos decentes, coerentes, trabalhadores, o comerciante que tá labutando aí, indo à falência por causa da decisão de vocês (referindo-se ao trabalho dos defensores públicos), ainda vem me falar de lockdown, rapaz, esse povo fumou merda, não é possível (...)."
 
De acordo com os autores da ação, a imitação homofóbica é fruto da ignorância e fomenta discursos de ódio em relação aos gays, lésbicas, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros.
 
"A violação explícita a direitos fundamentais dos gays é promovida pelo mais torpe dos fins: a audiência. Os direitos das minorias são utilizados como plataforma para que consiga projeção nos meios de comunicação e redes sociais", sustentam os defensores.
 
O documento cita ainda o Relatório Kinsey, segundo o qual os homossexuais representam 16% da população mundial, sendo 10% de gays e 6% de lésbicas. "Ou seja, no Brasil, a comunidade LGBTI representa 35 milhões de habitantes. São 35 milhões de seres humanos que clamam por respeito, reconhecimento e dignidade", diz outro trecho da ação, que arremata: "Basta!"
 
Punição – A ação civil pública cominatória, com pedido de liminar, solicita aplicação de multa de R$ 10 mil a cada declaração ou imitação homofóbica, discriminatória ou intolerante contra minorias afetivas, além de indenização de R$ 100 mil a título de dano moral coletivo, devendo o valor ser destinado ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos, regulamentado pela Lei no 9.008/95, com incidência de juros de mora desde a data do evento danoso (17 de junho).
 
A ACP também demanda a penalização dos requeridos a fazer a leitura de eventual condenação judicial no mesmo programa ou em similar, por duas ou mais vezes, pelo mesmo apresentador.
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