O advogado ambientalista Ilvanio Martins atua há mais de oito anos nesta área. Ele é integrante da ONG Fundação Ecotropica e na experiência que teve lidando com a defesa do meio ambiente, avaliou que o volume de queimadas neste ano não é maior que dos anos anteriores, mas sim mais concentrada.
Ele explica que a quantidade de queimadas que eram realizadas em um período mais espaçado neste ano aconteceram em um curto período de tempo, por isso os efeitos foram mais visíveis. Ele avalia que a postura e as falas do presidente Jair Bolsonaro (PSL) contra o Ibama e sua fiscalização incentivou a prática de queimadas criminosas.
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O advogado explicou que nem toda queimada é criminosa. Existem as permissões para que donos de terras realizem as queimadas, de maneira controlada. Porém, ele afirmou que neste período de seca todas as permissões são suspensas, portanto toda queimada realizada, mesmo por quem possui uma autorização, nesta época de seca são consideradas criminosas.
“A queimada, em princípio, é possível pensar que ela é permitida, só que nos limites da lei. É aí que está a diferença. Às vezes você tem uma autorização para fazer um desmate, um desbaste e até mesmo uma queima, mas eventualmente, por uma fração de tempo, você pode ter essa autorização suspensa, ou impedida de exercê-la em um certo período, que é esse que estamos agora. Nós estamos em um período que, ainda que haja autorização para fazer uma queima, dada as condições do clima e tempo nesse momento, você não pode exercer essa autorização”, disse.
Ele ainda afirmou que é responsabilidade dos donos de terras a proteção de suas propriedades. Segundo o ambientalista, um incêndio criminoso praticado por alguém, caso o fogo atinja as propriedades vizinhas, os donos destas terras vizinhas também podem ser responsabilizados.
“Por exemplo, o seu vizinho está fazendo uma queima, autorizada, mas devido as condições que se operou naquele momento, ele acabou provocando um incêndio na sua propriedade, o que você passa a responder por aquilo. Você se sujeita a ter que vigiar os seus vizinhos para que os efeitos da queima dele não te afetem e que você venha a responder por isso. Você é obrigado também a se proteger contra a queimada”.
Martins explicou que a lei exige que os donos de propriedades tomem todos os cuidados para evitar qualquer tipo de desastre. As queimadas que são realizadas com autorização do Estado, por exemplo, seguem técnicas específicas, com controle. Em algumas propriedades, inclusive, é necessário o emprego de um corpo próprio de combate a queimadas. “Não basta estar autorizado e sair metendo o isqueiro para cima”, disse.
Sobre as queimadas que aconteceram e estão acontecendo este ano, o ambientalista afirmou que não foi em um volume maior que nos anos anteriores. Ele disse que os efeitos foram mais visíveis em decorrência da concentração.
“Se tratando especificamente de Mato Grosso, esse ano, o efeito da queimada apareceu mais e mais forte para as pessoas porque ele foi mais concentrado. Se você pegar um mapa de áreas, tem vários institutos que estudam isso, ele vai trazer que o volume é igual ou menor, se for maior nem tanto, que os autorizados nos anos anteriores; A diferença está em você fazer uma queimada ao longo dos três meses da seca e fazer uma queimada de todo período dentro de em 30 dias. A queimada nos outros anos foi mais dissipada, pelos estudos o volume geral de número de queimadas não é muito diferente”.
Ele avaliou que esta concentração se deve às falas e à postura do presidente Jair Bolsonaro com relação às fiscalizações e multas do Ibama. Desde que assumiu o Governo, Bolsonaro tem feito críticas e ataques ao órgão.
“Os produtores rurais cada vez mais têm menos medo do Ibama. Eu paguei uma missão para ele [Ricardo Salles]: Mete a foice em todo mundo. Não quero xiita ocupando esses cargos, tem gente boa lá, tem, mas o homem do campo não pode se apavorar com a fiscalização e a fiscalização é no primeiro momento, advertir, caso persista no erro, aí tudo bem”, já declarou o presidente.
Medidas impostas pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, a mando de Bolsonaro, como a que obriga que as infrações ambientais sejam analisadas previamente por um “Núcleo de Conciliação Ambiental”, resultaram na diminuição de ações do Ibama. Bolsonaro já classificou a fiscalização do Ibama como “indústria da multa”, determinando ainda corte de verbas públicas.
Após a repercussão internacional das queimadas no Brasil, houve movimentação do Governo Federal para solucionar o problema. O presidente Jair Bolsonaro assinou o decreto de GLO (Garantia da Lei e da Ordem), que na prática, autoriza o envio de militares das Forças Armadas para ajudar no que for necessário. O advogado avalia que esta medida veio tarde demais.
“Do meu ponto de vista este decreto veio atrasado, ou seja, as pessoas já tinham feito esta queima desproporcional. Por exemplo, na época da Copa não esperou ter um tumulto nos Estádios para poder instituir, instituiu antes. Então agora nesta época da seca extrema, na época em que o Governo vinha dizendo que iria diminuir a fiscalização, que iria diminuir o combate, ‘agora tem é que produzir’. Aí todo mundo se sentiu despido da Lei, não se sentiu alcançada por ela. Aí por isso que concentrou tanto nesta época as queimadas. O peixe morre pela boca, e neste caso está morrendo pela fala”.
Illvanio também explicou que punições para quem for autuado por prática de queimada ilegal, podem ir desde uma advertência, em alguns casos multa, até chegar à pena de prisão. Já o país pode ser prejudicado nas relações comerciais internacionais e no recebimento de verbas para a proteção da Amazônia.
“Nós podemos ser prejudicados sim, com a imagem. A imagem de um país devastador é terrível. Então este cenário faz com que os países deixem de aportar recursos e ainda façam exigências sobre aquilo que já aportaram. E estes valores que vem são muito bem vindos, são muito bem aplicados”.