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MPF: legislação não restringe propriedade de portais de internet com conteúdo jornalístico

14 Jun 2016 - 14:08

Secretaria de Comunicação Social/Procuradoria-Geral da República

Portais eletrônicos que veiculam, além de notícias, conteúdo comercial e de entretenimento, não estão sujeitos às restrições constitucionais impostas a empresas jornalísticas quanto à participação estrangeira em seu capital. Esse foi o entendimento do Conselho Institucional do Ministério Público Federal (CIMPF), por nove votos a oito, em sessão de revisão realizada em 8 de junho.

A decisão do órgão máximo de revisão do MPF foi tomada ao analisar recurso da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) contra decisão da Câmara do Consumidor e Ordem Econômica, que homologou arquivamento de inquérito civil instaurado para apurar a participação de capital estrangeiro na empresa Terra Networks Brasil, o Portal Terra.

De acordo com a Constituição, pelo menos 70% do capital social ou votante de empresas jornalísticas devem pertencer a brasileiros natos ou naturalizados (artigo 222).

O CIMPF seguiu voto divergente do subprocurador-geral da República Mario Bonsaglia, que argumentou que, ainda que veiculem conteúdo noticioso, os portais de internet têm natureza diversa dos meios tradicionais de comunicação. A tese foi reforçada com a apresentação de estudos técnicos e pareceres jurídicos recentes.

O próprio Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgar a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 130, sobre a validade da Lei de Imprensa, consolidou entendimento de que a internet está fora do conceito de imprensa, por absoluta falta de previsão constitucional, alegou o subprocurador-geral.

Em seu voto, ele também citou nota técnica da Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados sobre a limitação de capital estrangeiro em portais da internet, que define tais plataformas como repositórios de conteúdos e informações de característica multimídia com modelos de interação heterogêneos e distintos dos encontrados em empresas jornalísticas. E lembrou, ainda, que a impossibilidade de equiparação dos portais de internet às empresas jornalísticas tradicionais foi defendida em parecer da Consultoria Jurídica do Ministério das Comunicações. Para o órgão, a matéria deve ser regulamentada por lei especifica.

Mario Bonsaglia ponderou que não se pode ignorar que empresas jornalísticas podem possuir sites, blogs e portais eletrônicos que complementam sua atividade fim. Por outro lado, portais da internet, como o administrado pela empresa Terra Networks Brasil, licencia conteúdo elaborado por terceiros, frequentemente sem chegar a produzir conteúdo jornalístico próprio. Por isso, não se caracterizam como empresa jornalística, nos termos da previsão constitucional.

O entendimento vai ao encontro do parecer da Câmara de Consumidor e Ordem Econômica (uma das sete Câmaras de Coordenação e Revisão do MPF, composta por três membros titulares), que homologou o arquivamento da investigação em relação ao Portal Terra por não vislumbrar irregularidades a serem apuradas. Para o colegiado do órgão revisor, empresa que atue como portal de conteúdo na internet não pode ser tratada de forma equivalente a jornais, emissoras de rádio e de televisão, dada sua especificidade e o fato de a internet se constituir num ambiente “descentralizado e sem fronteiras”.

Restrições não previstas - Mario Bonsaglia acrescentou ainda que, com a edição da Lei 12.965/2014, o chamado Marco Civil da Internet, o legislador infraconstitucional reforçou o respeito à plena liberdade de expressão, à pluralidade e à livre iniciativa, já previstos constitucionalmente. E ressaltou: “são esses justamente os valores constitucionais e legais que devem nortear a atuação do Ministério Público”.

Para o subprocurador-geral, não há, no texto constitucional ou em normas legais, suporte para que se dê prosseguimento a inquérito civil com o objetivo de impor medidas restritivas à divulgação de conteúdo jornalístico pelo Portal Terra. Além disso, lembrou que a propositura de eventual ação civil com esse intuito não é competência exclusiva do Ministério Público, podendo, inclusive, ser ajuizada pela própria Abert.

Histórico - O caso trata de inquérito civil instaurado para apurar a participação societária de capital estrangeiro superior a 30% da empresa Terra Networks, com eventual exportação indevida de dados de natureza comercial e cultural, bem como eventual dominação de mercado da informação, atividade de comunicação ou atividade jornalística.

A investigação teve inicio a partir de representação da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) e da Associação Nacional de Jornais (ANJ), enviada originalmente à 3ª Câmara de Coordenação e Revisão (Consumidor e Ordem Econômica), que determinou a remessa de cópias às Procuradorias da República em São Paulo e no Rio Grande do Sul.

As unidades do MPF arquivaram o caso, com o entendimento de que não haveria lesão ao direito do consumidor nem infração à ordem econômica. Ao ser revisado pela Câmara competente – Consumidor e Ordem Econômica, o arquivamento não foi homologado. O colegiado entendeu que o MPF deveria prosseguir com a investigação, com expedição de recomendação à Presidência da República e, eventualmente, proposição de ação civil.

Ao receber a recomendação para encaminhamento a Presidência da República, conforme prevê a Lei Complementar 75/93, no entanto, o procurador-geral da República solicitou o reexame da material à 3ª Câmara. Sob nova composição, o colegiado determinou a anulação das deliberações anteriores e homologou o arquivamento do inquérito, decisão contra a qual a Abert recorreu ao Conselho Institucional.

Por 9 votos a 8, o CIMPF entendeu que o inquérito não deve ter prosseguimento, considerando que, de acordo com a legislação vigente, não há infrações a serem investigadas.

Conselho - O Conselho Institucional é órgão do Ministério Público Federal, previsto no artigo 43, parágrafo único da Lei Complementar nº 75/93, composto pelos membros titulares das sete Câmaras de Coordenação e Revisão, totalizando 21 integrantes. Entre suas atribuições está a de julgar os recursos interpostos das decisões proferidas pelas Câmaras de Coordenação e Revisão.

Leia a íntegra do voto vencedor.
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