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Terça-feira, 15 de outubro de 2024

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O impacto das mudanças climáticas na saúde e segurança dos trabalhadores de acordo com a OIT

Autor: Carla Reita Faria Leal e Polyana Moreira Nogueria Tavares

24 Mai 2024 - 08:00

Foi publicado recentemente pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) o relatório “Ensuring safety and health at work in a changing climate” (Garantindo a segurança e a saúde no trabalho em um clima em mudança), produzido com o objetivo de apresentar evidências relacionadas a seis grandes impactos na saúde e segurança dos trabalhadores, que foram majorados pelas mudanças climáticas, os quais foram escolhidos pela gravidade de seus efeitos sobre os trabalhadores, são eles: o calor excessivo; o aumento da radiação ultravioleta (UV); os eventos climáticos extremos; a poluição do ar; as doenças vetoriais; e os agrotóxicos. Isso tudo sem que as normas e medidas de saúde e segurança no trabalho (SST) tenham evoluído para fazer frente a tais ameaças.
 
O tema dos impactos das mudanças climáticas sobre a saúde dos trabalhadores já foi abordado por nesse espaço anteriormente, mas ganha novo destaque com a publicação do referido estudo, uma vez que este aponta o crescimento do número de trabalhadores expostos a graves riscos para a sua saúde relacionados com as mudanças climáticas, tendo como consequências o desenvolvimento de cânceres, doenças cardiovasculares, doenças respiratórias, doenças renais, problemas relacionados à saúde mental, dentre outros.  
 
O relatório calcula que no período de 2000 a 2020 a proporção de pessoas que estão expostas ao calor excessivo em algum momento do seu dia de trabalho aumentou de 65,5% para 70,9%, o que significa mais de 2,4 bilhões de trabalhadores expostos a tal agressão no mundo, de uma força de trabalho global de 3,4 bilhões.
 
Entre os dados mais alarmantes do relatório da OIT é o que estima que 18.970 vidas e 2,09 milhões de anos de vida são perdidos todos os anos devido a 22,87 milhões de lesões ocupacionais atribuíveis ao calor excessivo, dentre as quais podemos citados os efeitos da radiação UV, com mais de 18.960 mortes anualmente, devido ao câncer da pele não melanoma, relacionadas ao trabalho.
 
Importante lembrar que as mudanças climáticas impactam não apenas no aumento das temperaturas, mas têm relação direta com a piora na qualidade do ar, sendo que, no particular, os números do relatório indicam que cerca de 1,6 bilhão de pessoas estão expostas à poluição atmosférica no local de trabalho, cujas doenças a esta relacionadas resultam em até 860.000 mortes anuais de pessoas que laboram ao ar livre.
 
Além das mudanças climáticas aumentar a frequência de eventos climáticos extremos (como as enchentes que estão sendo vivenciadas no Rio Grande do Sul), que também impactam a saúde e a segurança no trabalho, provocam o aumento da população de insetos vetores de doenças como malária, doença de Lyme, dengue, leishmaniose, chagas, dentre outras, que foram apontadas como causa da morte de mais de 15.170 trabalhadores por ano, de acordo com o mesmo relatório.
 
Ainda como consequência das mudanças climáticas, observa-se o aumento não só de insetos e parasitas vetores de doenças que atingem a população humana, mas também o aumento daqueles insetos que prejudicam a produção agrícola, gerando um crescente uso de agrotóxicos, produtos diretamente ligados ao adoecimento de trabalhadores por envenenamento, cânceres, doença obstrutiva do pulmão, supressão imunológica, dentre outras comorbidades, responsáveis pela morte de mais de 300 mil trabalhadores por ano, também de acordo com o relatório da OIT.
 
A Organização conclui o relatório indicando exemplos de respostas que devem ser adotadas pelos agentes públicos e privados responsáveis pela saúde no trabalho. Entre as medidas, menciona que, apesar de ser frequente encontrar nas legislações sobre saúde e segurança do trabalhador normas que estabelecem limites de temperatura aos quais o trabalhador pode ser exposto, é raro encontrar limites a exposição a raios UV e agrotóxicos, o que faz com tenha que ser pensada uma revisão nas normas sobre tais riscos, atualizando-as aos conhecimentos hoje acumulados sobre o tema.
 
O relatório deixa claro que o assunto é relevante e urgente, assim como que o diálogo de todos os setores da sociedade é essencial no desenvolvimento de ações para a mitigação dos danos causados pela mudança climática, com especial enfoque nos trabalhadores, uma vez que estes estão sendo direta e mortalmente atingidos por seus efeitos.
 
Carla Reita Faria Leal e Polyana Moreira Nogueria Tavares são integrantes do Grupo de Pesquisa sobre o meio ambiente do trabalho da UFMT, o GPMAT.
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