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Quinta-feira, 28 de março de 2024

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A premente necessidade da Constitucionalização da Justiça Criminal

Ao se analisar as notícias veiculadas pelos mais diversos meios de comunicação, verifica-se uma irretorquível Justiça Criminal arcaica e dissonante dos ditames constitucionais da Carta Magna.
 
É vigoroso o entendimento propalado por alguns daqueles que usam toga de que o direito fundamental à liberdade se encontra suspenso àqueles acusados da prática de crimes contra a administração pública.
 
Com todo o respeito aos entendimentos contrários, mas a conduta acima noticiada é um retrocesso, remetendo, pois, a uma justiça criminal piegas e ineficaz.
 
À título de exemplo, a colaboração premiada se tornou conditio sinequa non para que os investigados, acusados ou réus sejam colocados em liberdade. O que seria isso, senão uma ditadura, um Estado de Exceção?
 
Possuímos uma Carta Política irrefragavelmente democrática, que repele qualquer abuso, qualquer afronta aos direitos e garantias do cidadão.
 
Ocorre que, esse mesmo cidadão que a Constituição defende religiosamente comete violações nefastas contra a dita norma estatal, influenciados por uma mídia sensacionalista que impõe como medida de solução dos problemas encontrados a prisão, a transgressão aos direitos fundamentais e a mitigação da dignidade da pessoa humana para aqueles que se veem acusados da prática de um crime (notadamente contra a administração pública).
 
Infelizmente, o cidadão só percebe a importância da Lei Maior quando o Direito Penal bate em suas portas, a mando de um magistrado totalitário e a pedido de um promotor de justiça déspota.
 
Não se discute a necessidade de se punir aqueles comprovadamente culpados, após percorrido os trâmites do devido processo legal, no entanto, tal punição deve ser realizada nos limites constitucionais.
 
Imperioso lembrar a todos que a regra é a liberdade, ao passo que a culpa deve ser devidamente comprovada pelo órgão acusador, não sendo admissível a prisão ser o fim nela mesma. Prende-se para investigar, depois da prisão, pressiona-se o sujeito a colaborar, quase como uma forma de condição para ter os seus direitos fundamentais retomados.
 
Não se discute, entretanto, a eficácia e a importância do instituto da colaboração premiada, o que se sinaliza neste texto é apenas a forma de sua aplicação.
 
Recentemente, vimos o escândalo dos grampos sendo destaque nos telejornais nacionais.
 
Ora, dito escândalo macula a imagem deste Estado e corrobora ainda mais o mencionado Estado de Exceção atualmente vivido por nós, os brasileiros.
 
Aquele que determina uma interceptação ilegal, é tão criminoso quanto aquele suposto autor do cometimento de um crime.
 
Sem a pretensão de ser metafórico, às vezes, ao ler as notícias contemporâneas, fico em dúvida se voltamos no tempo, mais precisamente àqueles tempos nefastos do Regime Militar, onde, por exemplo, as interceptações a advogados eram feitas indiscriminadamente, sob o pálio de uma legalidade então fabricada pelo Estado.
 
CesareBeccaria, em sua maestral obra “Dos delitos e das Penas”, assim ensina:
 
“Entre as penas, e na maneira de aplica-las proporcionalmente aos delitos, deve escolher os métodos que causem, no espírito público a impressão mais eficaz e mais durável, e, ao mesmo tempo, menos cruel no corpo do culpado.”
 
 
Note-se que o supracitado autor italiano, ainda no Século XVIII, já preconizava a necessidade de haver proporcionalidade na aplicação das penas.
 
Nos dias atuais, estamos a ver milhares de especialistas no direito punitivo -remetendo aos tempos de Hamurabi-  e uma escassez de rábulas com entendimento de Direito Constitucionais.
 
Por fim, o que se espera é que os responsáveis pela aplicação da lei parem de bancar os super-heróis e passem a prestar continência à Constituição da República, porquanto, somente assim, estar-se-á diante do fiel cumprimento das normas insculpidas na Carta Republicana.
 
 
Pedro Henrique Ferreira Marques é advogado, especialista em Direito Penal e Processual Penal, especializando em Direito Processual Civil. 
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